26 de fev. de 2009

Da Confiança


O trechos a seguir fazem parte da obra Máximas e Reflexões do pensador francês La
Rochefoucauld. É uma obra que trás à tona uma profunda observação do ser humano, seu
comportamento, convívio, além de outros apectos que conduzem as complexas relações
humanas.Seu pensamento é marcado por uma dosagem de pessimismo e ironia a fim de
denunciar, desmacarar e criticar alguns comportamentos de sua época, porém ainda consegue,
em suas mensagens, exaltar os bons sentimentos. Da confiança, tema que pessoalmente tem
me instigado de forma pertinente, está presente na segunda parte desse livro (um dos
prediletos de Nietzsche), onde ainda trata de temas como da incontância, dos gostos, da
sociedade, dentre outros.


Embora a sinceridade e a confiança tenham relação entre si, são, no entanto, diferentes em
muitas coisas: a sinceridade é uma abertura do coração que nos mostra precisamente como
somos; é um amor da verdade, uma repugnância a se disfarçar, um desejo de se compensar
dos próprios defeitos e até de diminuí-los pelo mérito de confessá-los.

A confiança não nos
deixa tanta liberdade, suas regras são mais estritas, pede mais prudência e recato e nem sempre somos livres para dispor dela: não se trata unicamente de nós e geralmente nossos interesses se mesclam com os interesses dos outros. Ela necessita de justeza para não entregar nossos amigos, ao nos entregar a nós mesmos, e para não fazer presentes de seus bens com a finalidade de aumentar o valor daquilo que nós damos.

A confiança agrada sempre a quem recebe: é um tributo que pagamos ao mérito do outro; é um depósito que fazemos à sua lealdade; são penhores que lhe dão um direito sobre nós e uma espécie de dependência a que nos sujeitamos voluntariamente. Não pretendo, com o que digo, destruir a confiança, tão necessária entre os homens, porquanto ele é o laço da sociedade e da amizade: pretendo somente impor limites e torná-la honesta e fiel.

Quero que
ela seja sempre verdadeira e sempre prudente e que não tenha fraqueza nem interesse; bem sei que é difícil impor justos limites à maneira de receber toda espécie de confiança de nossos amigos e fazê-los compartilhar da nossa.

Na maioria das vezes confiamos por vaidade, por vontade de falar, pelo desejo de atrair a confiança dos outros e para trocar segredos. Há pessoas que podem ter razão em confiar em
nós e com quem não teríamos razões para ter a mesma conduta; com elas saldamos nossa
conta guardando seus segredos e pagando-as com pequenas confidencias.

Há outras cuja
fidelidade nos é conhecida, que nada nos escondem e em quem podemos confiar por escolha ou por estima. Nada do que só a nós se refere devemos ocultar delas, mostrando-nos sempre verdadeiros em nossas boas qualidades e mesmo em nossos defeitos, sem exagerar as primeiras nem diminuir os segundos, tendo por lei nunca lhes fazer meias confidencias; estas sempre embaraçam aqueles que as fazem e quase nunca satisfazem aqueles que as recebem: nós lhes transmitimos luzes confusas daquilo que queremos ocultar, aumentamos sua curiosidade, lhes damos o direito de querer saber mais e eles se julgam na liberdade de dispor daquilo que conseguiram saber.

É mais seguro e mais honesto nada lhes dizer do que se calar
depois de ter começado a falar.

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